Ao menos 15 fábricas de hidrogênio de baixo carbono operam ou estão em processo de implantação.
O Brasil é um dos países que reúnem as condições mais favoráveis para produzir em larga escala o chamado hidrogênio verde (H2V) e alcançar o protagonismo global na condução da transição das tecnologias energéticas baseadas em combustíveis fósseis para as renováveis. Além de privilegiado por ter fontes limpas de geração de energia, como água, vento e incidência solar, o país é rico na produção de biomassa, o que pode diferenciá-lo na produção do combustível.
Dados da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério de Minas e Energia, indicam que o Brasil tem potencial para produzir até 1,8 gigatonelada de hidrogênio por ano. Se for considerado apenas o potencial de produção a partir de fontes renováveis onshore, esse potencial cai para 18 megatoneladas/ano. Mesmo assim, esse volume já representa aproximadamente 20% da produção global atual de H2V, diz Felipe Gonçalves, superintendente de pesquisa da FGV Energia, centro de estudos mantido pela Fundação Getulio Vargas.
Atualmente, existem ao menos 15 plantas-piloto de hidrogênio verde no país ou em processo de implantação, a maioria delas voltada à produção a partir da eletrólise da água, que utiliza eletricidade de fontes renováveis, como solar, eólica e hidrelétrica. A região Nordeste é a que concentra o maior número de projetos para produção de hidrogênio de baixo carbono. O Ceará, por exemplo, congrega cerca de seis projetos relacionados ao desenvolvimento do H2V. O de maior destaque é o Hub de Hidrogênio Verde do Complexo do Pecém, criado em 2021 por meio de uma joint venture entre governo do Ceará e o porto de Roterdã, o maior e principal da Europa.
Outro Estado da região que tem concentrado projetos de desenvolvimento de hidrogênio verde é Pernambuco, que já conta com quatro plantas-piloto. Uma delas é o centro de testagem TechHub, do Complexo Industrial Portuário do Suape, que vai desenvolver tecnologias destinadas à produção de H2V. Inicialmente, o TechHub vai selecionar projetos de empresas instaladas no complexo industrial interessadas em criar tecnologias para geração de hidrogênio de baixo carbono. Numa segunda etapa, também serão aceitas propostas externas.
“O conceito do TechHub não é a produção em larga escala de hidrogênio verde. O centro vai atuar com plantas-piloto que possam ser desenvolvidas e que, após atingirem a maturidade e passarem por análise de viabilidade técnica, poderão ser aplicadas em grande escala”, explica o diretor-presidente de Suape, Marcio Guiot.
O potencial e as oportunidades que poderão ser abertas pelo hidrogênio verde têm atraído também o interesse de outras regiões, com usinas que usam uma variedade de processos que não apenas a eletrólise da água. Em Toledo, no Paraná, a Me Le Biogás Brasil desenvolve o projeto de uma usina de biometano para produzir hidrogênio de baixo carbono usando resíduos da cadeia de produção e
industrialização de proteína animal – suínos, aves, gado leiteiro e piscicultura.
De acordo com Neudi Mosconi, sócio administrador da companhia, a expectativa é que a primeira fase do programa possa alcançar uma produção local de aproximadamente 55 mil metros cúbicos de biometano por hora, que serão transportados por gasodutos até uma central com potencial de produzir mais de 3,3 toneladas por hora de H2V.
A primeira fábrica do combustível a entrar em operação no país fica na divisa dos Estados de Minas Gerais e Goiás, instalada na usina hidrelétrica de Itumbiara, da Eletrobras. Construída em 2021, em parceria com a startup BGEnergy, a planta atingiu a produção acumulada de 2 toneladas de H2V no ano passado, o maior volume já atingido por uma indústria dessa natureza no Brasil.
Recentemente, a Eletrobras assinou um memorando de entendimento com o braço no Brasil da Paul Wurth, de Luxemburgo, para colaboração no mercado de produção e utilização de hidrogênio renovável em processos industriais. “O hidrogênio verde desempenha um papel importante que vem se somar à geração hidrelétrica no fornecimento de energia limpa, sendo uma fonte com potencial de uso diverso para uma significativa redução das emissões de carbono e o desenvolvimento de uma economia mais sustentável”, defende o vice-presidente de comercialização e soluções em energia da companhia, Ítalo de Freitas.
A Engie ainda não tem plantas de H2V, mas planeja desenvolver 4 GW de capacidade instalada até 2030, sendo 1 GW no país. “O Brasil terá disponibilidade de recursos renováveis 17 vezes maior que sua demanda em 2050 e aqui podemos aproveitar as infraestruturas já existentes nos polos industriais [portos, dutos de transporte de gás, terminais etc]”, diz Maurício Bähr, CEO da companhia no Brasil.
A empresa firmou memorando de entendimento com o governo cearense para estudar projetos em Pecém com foco na exportação de hidrogênio e amônia verdes, mas também avalia o uso para a indústria local, como de químicos, aço e mineração, e oportunidades na Bahia, em Minas Gerais e no Paraná. “É muito mais vantajoso usar a sua [do Brasil] abundância de energias renováveis não para exportar um insumo, mas, sim, produzi-lo e usá-lo localmente, atraindo unidades industriais de setores intensivos”, afirma Bähr.
Por Valor Econômico.