Ibama recebe 97 pedidos de licenciamento de investidores que demarcaram áreas de interesse.
A geração de energia eólica offshore – em alto-mar – é a nova fronteira da expansão da fonte no Brasil. Um total de 97 projetos, que somam 234,2 gigawatts (GW) estão à espera de aprovação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), mas seu andamento depende da sanção do marco legal sobre o tema, o PL 11.247/2018, que tramita no Congresso.
O texto foi encaminhado ao Senado no fim de 2023, após passar pela Câmara dos Deputados, e sua aprovação depende de negociações sobre os chamados “jabutis”, emendas incorporadas ao texto que nada têm a ver com o foco da matéria. A sanção do marco regulatório das eólicas em alto-mar é do interesse do governo federal, do setor de geração de energia eólica, da indústria de óleo e gás e de
governos estaduais.
A expectativa prévia era que a lei das eólicas offshore fosse aprovada concomitante ao marco legal do hidrogênio verde, que saiu antes – foi sancionado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em agosto. Ambos os temas fazem parte da agenda verde do governo, sendo considerados prioridades para 2024. Uma vez sancionado o marco legal das eólicas offshore, o próximo passo deverá ser a realização de leilões de cessão de áreas marítimas, nos moldes dos que são realizados para exploração dos blocos de petróleo e gás natural.
“Os projetos de eólicas offshore que entraram com processos de licenciamento no Ibama são de investidores que já demarcaram as áreas de seu interesse, se antecipando ao marco legal”, diz Elbia Gannoum, presidente-executiva da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica).
A associação corre contra o tempo para convencer os senadores a votar a matéria antes do período eleitoral – com a aprovação do projeto de lei neste ano, os primeiros leilões de cessão seriam realizados em 2025, de modo que a construção dos primeiros parques eólicos offshore se daria por volta de 2029, e a geração de energia propriamente dita, entre 2030 e 2031. “O negócio de eólica offshore tem seu
próprio tempo de maturação. Por isso o Brasil precisa se apressar e dar o sinal regulatório correto ao mercado”, diz Gannoum.
A geração eólica em alto-mar contribuiria com oferta de energia renovável para o cenário de transição energética, abastecendo parte da demanda induzida pela produção do hidrogênio verde – a projeção é que até 2040 o Brasil vai precisar de mais 180 GW de energia para acomodar a produção do combustível.
Um estudo realizado pelo Banco Mundial em parceria com o Ministério de Minas e Energia (MME) aponta para um potencial acima de 1 terawatt (TW) de geração da eólica offshore até 2050, com cenários de desenvolvimento desta indústria capazes de aportar mais de R$ 900 bilhões em investimentos no país. Outro estudo, da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) fala em um potencial de cerca de 700 GW em
locais com profundidade de até 50 metros.
A Ocean Winds, joint-venture entre as gigantes do setor de energia ENGIE e EDP Renewables para projetos de eólica em alto-mar, tem 15 GW de capacidade prevista em projetos offshore no Brasil, localizados nos Estados do Piauí, Rio Grande do Norte, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, à espera do marco legal. A empresa montou escritório no Rio de Janeiro e tem prospectado parcerias locais, como um
memorando de entendimento com a Prumo Logística, controladora do Porto do Açu, no litoral fluminense, visando a um trabalho conjunto para projetos com pelo menos 1 GW de capacidade instalada.
“A experiência adquirida ao longo dos anos em outros mercados, como o Reino Unido, sublinha a importância de investir, desenvolver e apoiar a cadeia de fornecimento local por meio de colaborações e contratos estratégicos com atores e empresas locais”, diz Rafael Palhares, diretor de desenvolvimento de negócios da Ocean Winds Brasil e América do Sul.
Com o marco legal, a empresa pretende aprofundar os estudos mercadológicos, regulatórios, de coleta de dados em campo, ambientais e de recursos eólicos e da cadeia de suprimentos. Segundo o executivo, esses estudos são detalhados e têm um alto custo – da ordem de € 100 milhões por GW.
“Os projetos offshore, apesar de exigirem investimentos iniciais mais elevados devido à complexidade das instalações no mar, têm um potencial significativo para redução de custos a longo prazo”, diz Carlos Frederico Bingemer, sócio de energia do BMA Advogados. No caso da costa brasileira, o Banco Mundial aponta que o custo de geração do MWh pode chegar a R$ 350, mas, com a evolução da tecnologia, pode
cair para cerca de R$ 215 até 2050, se aproximando dos custos da geração eólica em terra.
Hoje, a fonte é considerada a mais competitiva do país, entre R$ 180 e R$ 200. No entanto, para que este mercado offshore possa decolar, na visão de Bingemer, é fundamental que seja ancorado por um big player, que seja capaz de atrair investimentos a partir de um arcabouço legal e regulatório que traga a segurança jurídica necessária.
Os quase cem projetos de eólica offshore que aguardam a definição do marco legal estão metade concentrados na região Nordeste, e o restante no Sul e Sudeste. São mais de 20 empreendedores, com forte presença de empresas do setor de óleo e gás – cerca de 40%, como , Shell, Equinor e TotalEnergies.
Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/publicacoes/especiais/energias-renovaveis/noticia/2024/08/30/projetos-de-eolicas-em-alto-mar-esperam-marco-legal.ghtml