Política nacional de barragens pode trazer insegurança jurídica, dizem associações

Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico acredita que isso abre margem para indenizações a qualquer habitante que acredite que seu imóvel foi desvalorizado em razão da existência de uma barragem.

O Fórum de Meio Ambiente do Setor Elétrico (Fmase) apresentou na quarta-feira (1) uma carta ao ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, na qual afirma que a proposta de uma política nacional para barragens pode trazer insegurança jurídica por não fazer distinção entre os tipos de reservatórios.

Segundo a entidade, que representa 16 associações dos segmentos de geração, transmissão, distribuição, comercialização e consumo de energia elétrica, o Projeto de Lei (PL) 2788/2019 necessita de aprimoramento por ser impreciso e deixar margem para que sejam desenvolvidas diversas interpretações sobre a construção de barramentos no país.

O PL, que trata da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB), foi aprovado na Câmara dos Deputados e tem previsão de ser votado na semana que vem no Senado Federal.

Na carta, o Fmase destaca que o PL não trata somente das barragens de mineração, mas das 23.977 barragens existentes, segundo o Relatório de Segurança de Barragens de 2022 da Agência Nacional de Águas (ANA).

Desse total, salienta o fórum de associações, 1.513 são de uso múltiplo, 2.646 são de abastecimento de água e 1.142 barragens são de hidrelétricas. Barragens de mineração totalizam 859 unidades.

Ao não fazer essa distinção, afirma o Fmase, abre-se espaço para impacto sobre milhares de prefeituras municipais e segmentos como o de agronegócio, turismo, pscicultura, energia, mineração, abastecimento e saneamento, entre outros.

Isso porque tais setores correm o risco de ter de indenizar qualquer habitante que acredite que seu imóvel foi desvalorizado em razão da existência de uma barragem, sem qualquer limitação de distância ou faixa de abrangência que justifique tal
desvalorização.

O PL começou a tramitar após o acidente com a barragem de Brumadinho, em 2019, um dos maiores desastres ambientais do país, que causou 270 mortes. Antes deste acidente, houve outro relevante, o rompimento da barragem de Mariana, em 2015, que domingo completa oito anos.

No caso de acidentes como os de Mariana e Brumadinho, cujas barragens em nada se assemelham às do setor elétrico, destaca o Fmase, o tratamento também é feito com base na legislação vigente, contudo com outra vertente, inclusive com a investigação e punição dos responsáveis.

“A entidade considera a política extremamente importante para o País e busca atender as populações atingidas por acidentes ocorridos por barragens (…) Portanto, ainda que seja elogiável a intenção do presente projeto, não há que se confundir os direitos da população atingida pela implantação e operação de barramentos, com as vítimas de acidentes nessas estruturas”, disse o Fmase na carta ao ministro.

Na terça-feira (31), o Ministério de Minas e Energia (MME) anunciou um acordo após receber representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) para uma reunião.

Em nota após o encontro, Silveira afirmou: “O debate foi muito importante para garantir a segurança energética e o desenvolvimento econômico-social do Brasil e o respeito aos direitos dos atingidos.”

O Valor apurou que o segmento não foi ouvido antes do anúncio do acordo entre o MME e o MAB para a elaboração de uma proposta de texto da política.

Procurado pela reportagem, o MME não respondeu até o momento. A ANA também foi procurada para comentar o caso, mas também não respondeu até o momento.

Gilberto Cervinski, integrante da coordenação nacional do MAB, disse que os atingidos por barragens estavam há 40 anos sem uma legislação que estabelecesse os critérios para indenização dos impactados e destacou que o PL está em tramitação há quatro anos, sem ter sido questionado por nenhuma entidade.

Afirmou também que as últimas audiências contaram com presença de representantes dos setores de energia elétrica e de mineração. E disse ainda não compreender porque o setor elétrico diz não ser ouvido.

“Não existia uma lei federal que garanta os direitos dos atingidos por barragens. Não importa se atingidos por lama ou água, é preciso ter o direito de ser ressarcido pela terra, pela perda”, disse Cervinski.

Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2023/11/03/politica-nacional-de-barragens-pode-trazer-inseguranca-juridica-dizem-associacoes.ghtml

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