Governo e consumidores se movimentam por mais oferta de gás natural

Abrace Energia sugere realização de leilões regulados de venda de gás natural, inspirados nos certames realizados há 20 anos no setor elétrico, para aumentar a concorrência no setor.

Depois de uma tentativa fracassada na gestão de Jair Bolsonaro de aumentar a oferta e reduzir os preços do gás natural como forma de dar maior competitividade ao setor produtivo, uma nova iniciativa surge no atual governo. A Abrace Energia, associação de grandes consumidores de energia, está propondo a realização de leilões regulados de venda de gás natural, inspirados nos certames realizados há 20 anos no setor elétrico, para aumentar a concorrência no setor.

Em paralelo, o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) realizou um diagnóstico sobre o mercado de gás de olho em melhores condições de fornecimento do produto para a indústria nacional, enquanto outra pasta, a de Minas e Energia (MME) busca envolver a Petrobras nessa empreitada.

No governo Bolsonaro, os esforços não permitiram reduzir os preços do gás. O então ministro da Economia Paulo Guedes falou inúmeras vezes em promover um “choque de energia barata”, algo nunca alcançado. Guedes chegou a falar em gás natural ofertado a US$ 2 por milhão de BTUs (unidade de medida do gás). Um dos principais entraves à empreitada é a reinjeção de gás natural nos poços de petróleo. Também pesou o fato de o governo não conseguir estimular maior competitividade no segmento.

As produtoras de gás natural reinjetam cerca de 70 milhões de metros cúbicos (m3/dia) para aumentar a produtividade dos campos do pré-sal. Neles, petróleo e gás são encontrados juntos, na mesma jazida (“associados”). Como o consumo de gás no Brasil é baixo e exige investimentos elevados, petroleiras, em especial a Petrobras, preferem reinjetar o gás para retirar mais óleo.

Agora os leilões seriam realizados em duas modalidades, de acordo com o presidente da Abrace, Paulo Pedrosa. Um deles seria de curto prazo, com contratos de até um ano de duração, voltados para campos que estão em produção. Esses leilões poderiam ter participação de indústrias que negociariam excedentes no mercado, como siderúrgicas que façam paradas programadas de altos-fornos. Seriam como os leilões da chamada “energia existente” do setor elétrico, que envolvem usinas prontas e em operação.

Outra modalidade seria de leilões nos quais produtores ofertariam contratos de cinco a dez anos de suprimento, vinculados à entrada em operação comercial de novos campos de gás. Estas rodadas seriam semelhantes àquelas para contratar energia de novas usinas, que fixam prazos para entrada em operação comercial que variam entre três e seis anos. Os preços seriam estabelecidos pelo próprio mercado, com base nas curvas de demanda, em vez de serem praticados a partir dos contratos firmados pela Petrobras.

A realização de leilões está prevista na Nova Lei do Gás (14.134/2021). Por outro lado, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) editou em dezembro de 2022 resolução que permite promoção de programas de venda de gás por leilões e remoção de barreiras para a venda do insumo por outros agentes. Pela proposta, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) organizaria e executaria os leilões, como no setor elétrico, cuja atribuição é da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

A consultora Ieda Gomes disse que ainda há dúvidas sobre como seria, por exemplo, a fixação dos preços do gás. Ela afirmou que na França a GDF promoveu um programa de “gas release” no qual fixou preços e negociou energia em certames.

No entanto, ainda há dúvidas se no Brasil os preços mínimos seriam fixados pela Petrobras ou pelo governo, acionista majoritário, o que poderia ser visto como uma intervenção.

O governo tem se movimentado nos últimos meses por mais gás. Em abril, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, anunciou a criação de um comitê de monitoramento de obras e projetos de gás em andamento e disse, em maio ser “inadmissível” o preço do gás ser da ordem de US$ 14 por milhão de BTUs para o consumidor final.

Em abril, o vice-presidente Geraldo Alckmin, que é também é titular MDIC, defendeu um “pente-fino” pelo governo no preço do gás natural.

Procurada, a Petrobras afirmou que não comentaria o tema, mas Chambriard, afirmou recentemente que a empresa quer desenvolver o mercado para colocar o produto da estatal, mas que isso não será feito a qualquer preço. “Precisamos que dê lucro. Se eu precisar baixar um pouco o preço do gás para que depois seja vantajoso para a empresa, vamos fazer.”

A ANP disse em nota que não tem ciência da proposta da Abrace e que no ano passado apresentou ao mercado uma sugestão de programa para reduzir a concentração do mercado de gás (ver matéria nesta página). Segundo a ANP, a agenda regulatória do órgão prevê a elaboração de análise de impacto regulatório para tratar do tema.

O estudo do MDIC ressalta que o preço médio do gás natural caiu 15% ao longo de 2022 com o maior número de ofertantes do insumo na malha integrada para distribuidoras e consumidores livres.

Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2024/06/10/governo-e-consumidores-se-movimentam-por-mais-oferta-de-gs-natural.ghtml

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