Diversificação da matriz elétrica traz necessidade de atualizar regulação

Modelagem atual não contempla crescimento de fonte limpa nem do mercado livre.

O governo federal terá a complexa tarefa nos próximos meses de revisar o modelo regulatório, decidir sobre a abertura total do mercado livre e reforçar a governança setorial. Em agosto, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, disse que o novo modelo teria como vetores a redução da conta para consumidores de baixa renda, a abertura do mercado, correção de encargos e subsídios setoriais para
reduzir assimetrias. Também afirmou, na mesma audiência na Câmara dos Deputados, que a discussão não será fácil, já que “muitos interesses estarão em jogo”.

A diversificação da matriz elétrica trouxe a importância de revisão do modelo setorial, criado quando 90% da geração do país era hidrelétrica e em um momento em que usinas eólicas e solares engatinhavam, a geração descentralizada era realidade distante e o mercado livre mal chegava a 10% da carga. Hoje 40% da carga está no mercado livre e 30% dos pouco mais de 225 GW de capacidade do país são de usinas eólicas e solares. A geração distribuída solar soma 30 GW supera 3,9 milhões de instalações.

“O modelo de 2004 não mexeu na questão estrutural da formação de preço e não revisou a garantia física das hidrelétricas, que são a base do sistema. De outro lado, não se buscou dar ferramentas para a gestão de demanda dos consumidores”, diz a presidente da Associação Brasileira da Energia Eólica (Abeeólica), Élbia Gannoum.

Pontos a serem tratados são a abertura do mercado para todos os consumidores e o tratamento aos contratos legados. O atual modelo, de 2004, fixa que os geradores ofertam contratos de longo prazo, de 25 anos a 35 anos, o que também contribui para financiar os projetos. São os contratos legados. Alguns vão até 2054. “Esse encargo de sobrecontratação que poderá ser criado será cobrado de quem? Será de
quanto?”, questiona Fabiola Sena, CEO da Fset.

Estudo da PSR para o então Ministério da Economia de agosto de 2022 indica que, para cobrir os custos desta transição, um encargo deveria ser aplicado aos consumidores cativos, livres e autoprodutores para que essa mudança regulatória não onere ainda mais o ambiente regulado, que tem arcado com os custos da sobre contratação com o avanço do mercado livre. Resolver esse ponto é vital também para que as distribuidoras possam saber como ficará a abertura e que a estrutura tarifária não pese sobre os consumidores que continuarem no mercado cativo.

Aperfeiçoar a governança setorial é um ponto importante. O papel da agência reguladora está em xeque, seja por pressão de agentes, Executivo ou brigas internas de diretores. A Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) ainda sofre com falta de autonomia financeira e quadro defasado. “A agência enfrenta situação de exaustão contínua e constante evasão de servidores e conta com um quadro inferior a 557
servidores, o que representa uma defasagem superior a 27% em relação ao previsto por lei”, afirma documento da Associação dos Servidores da Agência Nacional de Energia Elétrica.

Em um setor cada vez mais complexo, a independência dos órgãos setoriais ganha relevância. “Para evitar o pior, é preciso reconhecer que é a dupla ONS-EPE que sabe o que o sistema necessita, e não a dupla lobby-Congresso. Não sei se há caminho político para que essa obviedade resulte na ampla reforma que o setor necessita”, afirma Jerson Kelman, que chefiou a comissão que analisou as causas do racionamento de 2001 e dirigiu a Aneel entre 2004 e 2008.

Outro ponto a ser resolvido é a estrutura tarifária. Hoje, 12,5% da conta de luz, segundo dados do governo, referem-se a subsídios e encargos, sendo que o consumidor do mercado cativo paga todos, enquanto autoprodutores e consumidores livres ficam isentos de alguns. A geração distribuída solar também está baseada em subsídios cruzados.

A lei 14.300, que criou o marco regulatório da GD solar, estabeleceu que parte das perdas das distribuidoras com a migração para a tecnologia será atenuada por um mecanismo de compensação de receitas. No primeiro ano de cobrança do mecanismo, a consultoria Volt estima que ele atinja R$ 700 milhões e poderá chegar a R$ 4 bilhões em 2030.

Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/publicacoes/especiais/energias-renovaveis/noticia/2024/08/30/diversificacao-da-matriz-eletrica-traz-necessidade-de-atualizar-regulacao.ghtml

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