Matriz energética majoritariamente limpa e renovável traz competitividade na atração de investimentos, em relação a outros países.
A transição energética, que visa modificar os sistemas de produção e de consumo de energia direcionando-os para fontes limpas e renováveis em detrimento das fontes fósseis, é uma das prioridades da agenda brasileira na presidência do G20. O Brasil se destaca no cenário global neste tema pelo seu extenso uso de hidrelétricas, devido aos progressos na área de biocombustíveis e a seu grande potencial em energia solar e eólica. São justamente essas condições que qualificam o país a receber investimentos para promover a transição.
Para Patricia Pinho, diretora-adjunta de ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam) e autora do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o Brasil vem se posicionando muito bem nas questões climáticas desde a CPO de Dubai, nos Emirados Árabes. Mas vale ressaltar, diz ela, que muitas das projeções feitas em relação à condição brasileira de atratividade e competitividade foram construídas sem considerar os agravantes climáticos que estão chegando de forma rápida.
“Esse é um desafio que está posto para o Brasil perante o G20 e o país ainda patina na agenda de alavancagem de adaptação, uma vez que os desastres ambientais de grande magnitude na esfera do clima já atingem praticamente todos os Estados e municípios brasileiros”, diz Pinho ao citar a seca de maior extensão e intensidade dos últimos 70 anos que atingiu quase 60% do território brasileiro e os quase 165 mil focos de incêndios florestais só em 2024.
Apesar desta avaliação, a diretora do Ipam diz não acreditar que essa condição climática negativa afete a atração de investimentos externos. “Temos um Produto Interno Bruto (PIB) muito associado à geração de commodities e depois, diante de um clima alterado, os setores terão de se adaptar. O energético é um dos principais onde teremos de ter a transição energética. Neste caso, o Brasil é um país privilegiado por ter uma matriz limpa e renovável”, afirma.
Além de políticas públicas alinhadas às metas de descarbonização, os municípios brasileiros vão precisar desenvolver com urgência planos de adaptação. “O problema é que falta capacidade técnica e financeira para conseguir elaborar esses planos”, diz Pinho.
Para Rodrigo Rollemberg, secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), é preciso ter um olhar atento para a questão, mas também avaliar se 2024 foi um ano atípico para eventos extremos ou se já se trata de uma tendência decorrente do aquecimento global. “O fortalecimento já está sendo feito nesse
sentido com o Ministério do Meio Ambiente reforçando as equipes do Ibama”, diz.
Rollemberg observa que o Brasil teve avanços. Como exemplo, cita a aprovação do Projeto Mover, que cria incentivos para a descarbonização da indústria automotiva, a regulamentação do hidrogênio de baixo carbono como opção na produção de energia e o combustível do futuro.
A estratégia de baixo carbono da Confederação Nacional da Indústria (CNI) já está desenhada, segundo Davi Bomtempo, superintendente de Meio Ambiente e Sustentabilidade. Por meio do Business 20 (B20), que conecta a comunidade empresarial aos governos do G20, o setor industrial entregou ao presidente Lula um documento com cinco pilares estratégicos, propondo soluções para temas relevantes, entre eles o da transição energética.
“Um item que merece atenção dentro da transição energética é como fortalecer nossa política nacional de biocombustíveis e é uma agenda para a qual o Brasil já está pronto”, diz Bomtempo.
Para Rosana Santos, diretora executiva do Instituto E+ Transição energética, neste ponto, o país está “uns 20 anos à frente da do resto do mundo” porque investiu em hidrelétricas e criou o Proálcool, o que o coloca em uma posição mais competitiva, mas não pode se acomodar.
“O Brasil precisa manter os investimentos nas matrizes limpas. O setor elétrico brasileiro é um ativo que tem de ser preservado porque onde a gente está hoje em termos de vantagem competitiva não significa que é onde estaremos no futuro, caso se amplie o uso de fontes menos limpas com a justificativa de garantir a segurança energética”, acrescenta a diretora do instituto, um think tank brasileiro independente que atua como influenciador de políticas públicas para transição energética.
Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/brasil/g20-no-brasil/noticia/2024/10/11/brasil-tem-vantagem-mas-precisa-de-mais-medidas-para-transicao-energetica.ghtml