Para o presidente do conselho de administração da Matrix Energia, capacidade de geração de energia renovável dá ao País vantagem competitiva.
Wilson Ferreira Jr. acaba de aceitar um novo desafio: a presidência do conselho de administração da Matrix Energia. O ex-dirigente de Cesp, CPFL, Eletrobras e Vibra Energia destrincha o mercado de energia livre, que em poucos anos deve chegar aos 80 milhões de consumidores na pessoa física. Sim, os brasileiros poderão escolher de quem vão comprar energia elétrica.
O mercado será gigante, explica o executivo, para quem o Brasil, devido a características naturais que favorecem a geração de energia renovável, vai liderar o processo de transição energética no mundo. “O Brasil vai ser um hub de energia”, diz, referindo-se ao potencial do País para atrair investimentos.
Hoje, consumidores de alta-tensão já podem escolher a distribuidora de energia. “E muitos têm interesse em ser
atendidos exclusivamente por fontes de energia não poluentes. É um momento de maior competição”, afirma. Seguem os principais trechos da sua conversa com o Estadão.
Há risco de a gente perder a oportunidade de liderar o processo de transição energética?
Acho difícil. Temos enormes vantagens comparativas, e o mundo vai precisar muito delas. Nós somos o país que detém a maior floresta tropical do mundo. Reduzir emissões é uma coisa, mas o carbono que está na atmosfera tem de ser capturado. Uma boa parte, eu diria de 30% a 40% da captura do carbono, ocorre em florestas tropicais como a amazônica. Em áreas desmatadas, temos a capacidade de reflorestá-las para produzir, por exemplo, biocombustíveis. Temos um dos maiores índices de insolação do mundo, o vento que nós temos na costa brasileira, notadamente no Nordeste, é um dos melhores para energia eólica.
Quais as tendências em termos de geração de energia?
chamadas fontes intermitentes, a solar, a eólica, o crescimento da biomassa. E também a entrada mais massiva das usinas termoelétricas. Que, apesar de serem mais poluentes, independem de fatores climáticos. Assim, as pessoas acabaram fazendo uma gestão mais eficiente das fontes de energia, e nós tivemos uma sobra a partir de 2004. Nesse momento surgem os principais agentes para operar no mercado livre. No mercado regulado, as tarifas são estabelecidas pela Aneel. O mercado livre compra energia no mercado de geradoras. No Brasil, os preços são
voláteis por razões estruturais. Pouco mais de 60% do volume de energia é produzido por hidrelétricas. Como não é possível controlar chuva, em anos muito chuvosos o preço cai; em anos pouco chuvosos, ele sobe. Essa volatilidade aumentou à medida que a gente acrescentou na matriz elétrica a solar e a eólica, que são o que a gente chama de fontes intermitentes. A solar depende do sol e a eólica, de ventos.
São mais limpas, certo?
Noventa por cento dela é limpa. Essa volatilidade é porque você mede energia a cada momento do dia. E, em função do mercado livre, você tem um preço da energia, os agentes ou que não conseguiram vender ou que venderam a energia precificam a energia 24 horas por dia. Então, você tem uma expectativa dos consumidores do mercado livre de terem preços mais baixos do que os do agente regulado. O que é novo? Existe uma recomendação de que consumidores com alta demanda de energia sejam ligados na alta-tensão, acima de 2,3 mil volts. Então, a partir de 2000 você teve um regime que culminou, em 2024, em um regime de liberação desses grandes consumidores, 150 mil clientes, para que eles pudessem migrar para o mercado livre. Muitos consumidores têm interesse em ser atendidos exclusivamente por fontes de energia não poluentes. Então é um momento de maior competição.
Como está a regulamentação para empresas trabalharem aqui em termos de meio ambiente, de energia elétrica?
Está andando. Somos um dos cinco maiores em energia eólica e solar do mundo. Uma das regulamentações importantes é a de liberação e qual vai ser o ritmo de liberação dos consumidores do grupo B (ligados à rede de baixa tensão, atendidos pelo mercado regulado). Esse debate começa agora no Congresso. Existem vários países onde os consumidores são livres para escolher quem é seu fornecedor.
O mundo está ficando muito dependente de energia elétrica, não? Carro elétrico, uma série de demandas novas. O mundo tem condição de fornecer tudo isso de energia?
O mundo tem mais dificuldade de fazer isso do que o Brasil. (O desenvolvimento da) inteligência artificial está multiplicando por 10 ou às vezes 20 a demanda por data centers para processar essa informação, a quantidade de dados processados é enorme. É um negócio que precisa de energia renovável, de contingência, eu
acho que o Brasil vai ser um hub de energia.
Pode traçar um cenário sobre o tema energia elétrica em 10 anos ou 15 anos?
Para se descarbonizar, o mundo tem de sair das fontes que queimam carvão, óleo, gasolina etc. Então, ele vai se eletrificar. A forma de alimentar isso é usar fontes cada vez mais renováveis. Os países estão investindo em solar e eólica, embora com menos eficiência que o Brasil. Não vai acabar o petróleo, vai trocar o carvão, o óleo combustível, por gás natural. Eu diria que o Brasil tem uma vantagem espetacular. O Brasil tem 220 mil MW de
energia instalados. Como comparação, uma usina como Itaipu, que é a maior (do País), tem 14 mil MW. Só de potencial de eólica no continente nós temos cerca de 400 mil MW. Em 1960, tínhamos 5 mil MW instalados. E eu estou falando só de uma fonte, você tem mais 100 mil MW de hidrelétrica, tem o gás do pré-sal, uma quantidade solar imensa. E solar é a fonte que mais vai crescer. Então eu não tenho dúvida de que nós somos o celeiro energético do mundo para alimentar o processo de descarbonização.