Há mais de um ano sem fechar contratos, fabricantes estão parando produção ou otimizando a capacidade produtiva.
O processo de desindustrialização na cadeia eólica brasileira gerou alarme no setor neste início de ano, com a notícia de que mais fabricantes vão parar ou diminuir a produção devido à baixa demanda de contratos no mercado interno. A empresa catarinense WEG optou por paralisar a linha de montagem, enquanto a alemã Nordex decidiu reduzir a produção.
Em março, a fabricante de pás Aeris encerrou o contrato com a Siemens Gamesa e anunciou medidas para adaptar suas linhas de produção e otimizar a capacidade produtiva. Não é de agora que o setor passa por dificuldades. Em 2023, a Siemens Gamesa hibernou as operações da fábrica em Camaçari (BA) para ajustar sua estrutura produtiva e atender às demandas do mercado.
Em 2022, a americana GE Renewable Energy revisitou sua estratégia global e anunciou a suspensão da produção de novas turbinas eólicas no Brasil. A decisão das empresas reflete um cenário desafiador para toda indústria eólica, que há mais de um ano não fecha contrato no Brasil. O último acordo de relevância aconteceu no início de 2023 entre Vestas e Casa dos Ventos. Em 2023, o Brasil instalou 4,8 GW em novas unidades. A previsão para 2024 é uma queda de quase 50%.
Em nota, a Nordex diz que não paralisou a produção no Brasil, apenas ajustou a capacidade produtiva à baixa demanda atual do mercado eólico. “A Nordex tem fábricas de torres, nacelles e moldes de pás operativas durante 2024 no Brasil, porém com produção reduzida, à espera de que o volume de vendas volte a crescer”, disse a empresa em nota.
A Nordex reforçou que manterá as fábricas ativas para atender o mercado brasileiro, que segue sendo relevante para a companhia no mundo. Apesar do aumento global de instalações de geração de energia eólica em 2023, puxado pela China, as empresas acumulam prejuízos causados pela inflação e juros altos.
A presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica (Abeeólica), Elbia Gannoum, lembra que segmento vinha experimentando recordes de crescimento desde 2018. Entretanto, em meados de 2022, o preço de referência da energia elétrica, conhecido como Preço de Liquidação das Diferenças (PLD), no jargão do setor, caiu para patamares mínimos, o que inviabilizou a expansão.
“As contratações até meados de 2022, cessaram. Estamos com uma crise de contratos porque a economia não está crescendo e estamos há dois anos com PLD baixo. Com isso, o mercado não contrata”, diz a executiva.
O vice-presidente de Assuntos Públicos da Vestas para a América Latina, Leonardo Euler, frisa que a situação de desindustrialização afeta não apenas as fabricantes, mas toda a cadeia de suprimentos primária, como empresas de torres e pás eólicas.
Algumas já decretaram a suspensão temporariamente de contratos de trabalho. Entre as causas, Euler lista o que classifica como “subsídios perversos dados ao setor de geração distribuída”, que desloca a demanda, a elevada taxa de juros e a necessidade de uma política industrial verde. “Há uma cadeia a montante para que a Vestas esteja no Brasil e se ela continuar sendo desestruturada, fica cada vez mais desafiador permanecer no país”, diz.
O receio do setor é que quando a movimentação em torno da economia global por transição energética for retomada, o Brasil esteja dependente de importação principalmente de empresas chinesas.
Em tese, essa demanda já existe. A diretora de Políticas Brasil do Conselho Global de Energia Eólica (GWEC, na sigla em inglês), Roberta Cox, lembra que durante a COP28, o mundo se comprometeu a triplicar as energias renováveis até 2030 e isso tem impacto direto na cadeia de suprimentos. Segundo ela, o Brasil pode aproveitar este movimento para se tornar um fornecedor de equipamentos.
“Neste cenário, já em 2026 vai faltar equipamentos, como pás, torres, nacelles e minerais. Como o Brasil tem uma cadeia estabelecida, pode aproveitar estes nichos e se tornar um fornecedor, já que o mercado interno não tem absorvido essa
oferta”, afirma.
No âmbito internacional o cenário é completamente diferente. Os pacotes verdes implementados por Europa, China e EUA enviaram sinal de compromisso ao setor, já que visam atrair investimentos para a indústria de energia limpa.
Por Valor Econômico.
https://valor.globo.com/empresas/noticia/2024/04/16/desindustrializacao-do-setor-eolico-acende-alerta.ghtml